Nesta segunda-feira (19), é celebrado o Dia Internacional dos Povos Indígenas.
Cristiane é indígena da etnia Potiguara e nasceu no município de Marcação, na Paraíba. Ela atua como professora dos ensinos fundamental II e médio na aldeia Akajutibiru, em Baía da Traição, onde desenvolve um trabalho que inclui no currículo da rede de ensino a obrigatoriedade da temática “história e cultura afro-brasileira e indígena". E não cansa de aprender. Também é estudante da especialização em educação étnico-racial na educação infantil do Centro de Humanidades da Universidade Estadual da Paraíba (UEPB).
Atualmente, como professora, Cristiane transmite tudo aquilo que aprendeu durante anos de estudo, pesquisa e vivência.
“Falamos sobre o nosso povo, nossas tradições, nossos direitos, resgatamos nossas línguas. Eu me identifico como Potiguara porque tenho minhas raízes e minha ancestralidade. Minha irmã já foi cacique e, inclusive, foi quem me influenciou a participar do movimento indígena, o que me fez também buscar o curso de história, para me tornar professora e ensinar as próximas gerações sobre a nossa cultura, nossas origens”, avalia Cristiane.
Filha de uma marisqueira e de um agente fluvial da Marinha brasileira, ela tem oito irmãs, sendo uma irmã gêmea, além de três irmãos. Das oito mulheres, seis são professoras. E não é por coincidência, já que, segundo Cristiane, a educação foi o agente transformador da família, com total incentivo do pai, José Ferreira Padilha.
"Meu pai sempre nos incentivou muito para a gente estudar e se formar. Ele dizia uma coisa que nunca me esqueço: estudem, se formem para vocês serem independentes e não dependerem de ninguém, nem de homem nenhum", contou.
Preconceito e identificação
Ainda na infância, aos 11 anos, a paraibana começou a sofrer preconceito por se autodeclarar indígena. Nessa época, também, surgiu o desejo de saber mais sobre a sua ancestralidade.
"Ingressei no curso de história e dentro do movimento [indígena] por, aos 11 anos, ser muito discriminada por me assumir indígena, que, naquela época os mais velhos chamavam de cabocla, mas hoje nos identificamos Potiguara, que é a nossa etnia", explicou.
Cristiane conta que o pai também foi fundamental no seu processo de aproximação das raízes indígenas. "Meu pai foi um exemplo de ser humano e de amorosidade para família. Jamais vou esquecer o elo que ele nos manteve por sendo criada em sítios, marés e próximos ao mar, fazendo com que a gente tivesse um vida saudável e feliz", contou.
Segundo a professora, um dos principais motivos para que ela se formasse em história foi "a ligação, que teve desde a infância com a natureza e se auto afirmar como indígena".
'A educação é o pilar da construção do nosso futuro'
Desde muito cedo, a maior paixão de Cristiane é ler. Sempre foi incentivada pela família a ler e assim desenvolver criticidade. "Quando alguém me perguntava o que eu queria ser quando crescesse, eu sempre respondia: eu quero me formar e ser independente!".
"A educação é o pilar da construção do nosso futuro. Quando falo disso, falo de todas nós, das seis irmãs, porque mesmo a gente continuando na aldeia, conseguimos construir uma nova trajetória. Hoje somos cidadãs críticas, cada uma com sua forma de pensar, respeitando a opinião dos outros", afirmou.
Cristiane fala das irmãs cheia de orgulho. Cada uma, do seu jeito, conseguiu atender ao pedido do pai, de estudar e ser independente. A potiguara atua há pelo menos 20 anos na área da educação."Faço parte do movimento na área da educação escolar indígena onde fui protagonista em lutar pela estadualização de uma escola, em 2009, que leva o nome do pai, a Escola Indígena de Ensino Fundamental José Ferreira Padilha. Essa foi uma conquista muito importante pra o município de Marcação e aldeia do Vai", conta.
De geração em geração
Assim como Cristiane e as irmãs tiveram o incentivo dos pais, ela também é a maior incentivadora do filho, que é o primeiro jornalista potiguara paraibano. José Ferreira Padilha Neto se formou em jornalismo e atualmente mora no Rio de Janeiro, onde busca o sonho de se tornar ator.O orgulho da professora do filho, das irmãs, da trajetória de seus pais e do seu povo são evidentes em cada detalhe de superação e vitória de sua história. O desejo dela é que mais indígenas possam também ocupar cada vez mais espaços e realizar seus sonhos, escolhendo suas profissões e tendo, claro, seus dons reconhecidos e valorizados. O caminho disso, para Cristiane, é um só: a educação.
FONTE:https://g1.globo.com